segunda-feira, 25 de junho de 2012

"Blog Perfil" - Bruno de Castro

Ele é dono de um dos melhores textos do jornalismo cearense. Desde a sua passagem pelo jornal O Estado que venho acompanhando o seu trabalho como jornalista. Quando passei pela editoria de política desse periódico, lá encontrei o amigo e excelente profissional Bruno de Castro (foto), durante aquela brilhante equipe comandada pela jornalista Elizabeth Rebouças. Foi através dele que aprendi os meandros do jornalismo político, sem nenhuma modéstia. Bruno, ao entrar de férias naquela ocasião, deixou toda a sua demanda comigo. Foi uma experiência formidável. Lembro que ficou sob a minha responsabilidade a série de reportagens especiais sobre as sete Secretarias Executivas Regionais (SERs) de Fortaleza, pautas que, se não fosse as férias merecidas do colega Bruno de Castro, seriam realizadas por ele. Mas, felizmente, dei conta do recado e não decepcionei. Ao convidar ele para o quadro "Blog Perfil" desta semana, o mesmo mostrou-se receoso, mas logo atendeu o nosso convite. E, aqui está a sua entrevista, publicada na íntegra, e com respostas altamente bem embasadas, típico de grandes jornalistas. Desde já, agradeço a atenção e o carinho, certos de que o jornalista Bruno de Castro continuará sendo esta pessoa humana, ética e, acima de tudo, um profissioanl de mão cheia. Seus colegas do jornal O Povo e da Assembleia Legislativa do Ceará atestam o que estamos falando aqui. Enfim, boa leitura! 

Blog - Por que ser jornalista?

Bruno de Castro - Enxerguei o Jornalismo pela primeira vez em 2002, quando cursava o segundo ano do ensino médio. Culpa de uma gincana de colégio que organizei. Foi ali que notei o quanto histórias alheias mexiam comigo. E como eu sentia a necessidade de me "apropriar" delas para, de alguma forma, melhorar a de outras pessoas. É isso o que me norteia quando pego qualquer pauta que seja. Fui começar o curso de Comunicação Social/Jornalismo na Faculdade Integrada da Grande Fortaleza (FGF), em 2004, para ter a certeza de que queria aquilo pro resto da vida. Me sinto um privilegiado, pra ser sincero. Imagine: conheço gente nova todo santo dia e tenho o papel de conversar com elas (sobre dores, amores, dissabores e maravilhas da vida) para expor/modificar determinada realidade. Só que, no fim das contas, funciona assim: os personagens que modificam a gente. A cada diálogo com eles, um novo Bruno surge. Tanto como repórter quanto como pessoa. O jornalismo é mágico.

Blog - Qual a pauta jornalística que você mais gostou de realizar? E por que?

Bruno de Castro - Olha...tarefa difícil essa de escolher "a melhor" pauta. Mas arrisco dizer que foi a cobertura do caso Kaio Cardoso. Lembro claramente: era 18 de outubro de 2010 quando cheguei à redação do O POVO e Tânia Alves (editora-executiva do Núcleo de Cotidiano do jornal) me pediu para fazer uma matéria "sobre um menino doente". Ela encaminhou um e-mail que recebeu da repórter Mariana Toniatti (também do O POVO) contando a história do Kaio, com três anos à época (hoje com cinco). Confesso resistência inicial. Tenho certo melindre para falar de doenças. E tinha certeza de que encontraria uma criança prostrada...definhando. Mas a vida me apresentou justo o contrário. Na verdade, me presenteou com uma história linda de superação. A repercussão foi enorme e, por conta disto, passamos a acompanhar mais de perto a luta dele para encontrar um doador de medula óssea e curar-se da anemia aplástica. Cinco meses após o nosso primeiro contato (e "n" matérias publicadas), acharam uma doadora na Alemanha. Mais repercussão positiva: a vitória acabou virando manchete do jornal. Alguns podem classificar isto como algo bobo. Eu não. Explico: no mesmo dia, a Polícia Militar havia apreendido 500 mil CDs e DVDs piratas em Fortaleza. Esta matéria, por um apelo comercial óbvio, estava cotadíssima para ser a manchete. Mas a sensibilidade do jornal e que o Kaio impôs fizeram com que optássemos pela chamada "agenda positiva". Sou da tese de que notícia boa também vende jornal. Não abro mão disso. Tanto que resolvi aceitar o convite de escrever um livro cuja história vai ter a luta do Kaio como roteiro. Vamos ver no que vai dar! 

Blog - Como é atuar em redação e em assessoria de Imprensa ao mesmo tempo? Dá para conciliar as duas atividades profissionais?

Bruno de Castro - Dá para conciliar perfeitamente pelo fato de serem áreas distintas. Na assessoria, lido com política. No jornal, com o cotidiano da cidade. Na verdade, muito dos debates que acompanho na Assembleia Legislativa complementam a composição de uma visão mais crítica de como o lugar onde vivo deveria ser. Inúmeras pautas nascem de algo que ouço durante uma sessão plenária ou uma audiência pública. É interessante perceber o imbricar dos dois temas. O ritmo de jornal, claro, é muito mais acelerado. Em assessoria, a gente tem a possibilidade de planejar as ações com cautela (exceto em momentos de crise). Nós meio que somos "senhores" do nosso calendário. Na redação, não. A gente depende exclusivamente do outro. É ter a certeza apenas do horário de entrada (e, às vezes, nem isso). Mas é aquela coisa: quando a gente gosta, não há cansaço que derrube. É gratificante demais! 

Blog - Hoje, você é repórter do Núcleo Cotidiano do jornal O Povo. Como é a experiência de trabalhar em um dos dois maiores veículos impressos do Ceará?

Bruno de Castro - Quando fui chamado para O POVO, em março de 2010, assumi o cargo com um peso grande nas costas. Parecia uma montanha. Eu vinha de um veículo pequeno (jornal O Estado) para a maior editoria do jornal mais antigo do Ceará. Me deparei com uma equipe compenetradíssima e um nível de cobrança por excelência de serviço jamais visto. Foi preciso um período para adaptação. Pedi muita ajuda a quem tornou-se mais próximo ali. E, sim, pensei (por inúmeras vezes) que não daria conta do recado. Cogitei cair fora, inclusive. Mas a segurança passada tanto pelos colegas quanto pela chefia me fez tentar. Até então, só tinha escrito matérias sobre política. Jamais havia me aproximado de um caso como o do Kaio, por exemplo. Foi uma mudança brusca de ambiente e de modo de trabalhar. O texto político é carregado (venenoso, até). O de cidades é algo necessariamente mais leve (sem perder a criticidade, obviamente). Tive que desacelerar. E, até tudo se encaixar, foi um processo um tanto sofrido. Mas, acho, deu certo. Sei que tenho uma imensidão de coisas a aprender, mas já me orgulho de certas oportunidades tidas no O POVO. E falo isso sem qualquer falsa modéstia. A equipe com a qual trabalho é especial por demais. A gente costuma se colocar não como companheiros de redação, mas como uma família. E é isto mesmo.

Blog - Indique uma sugestão de leitura cultural/jornalística para os nossos leitores.

Bruno de Castro - Só uma? Que maldade! Vou citar algumas de minhas paixões dos últimos anos. Tenho como obra prima "O menino do pijama listrado", de John Boyne. Acompanhar o modo como o protagonista, coincidentemente chamado Bruno, narra um episódio delicado como o Holocausto de uma forma tão pura. Ele faz reflexões tão simples que chocam. "Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios", de Marçal Aquino, é outra recomendação. O cara tem um ritmo de escrita sensacional e escolheu o Pará como cenário de uma história linda e trágica. "Os meninos da Rua Paulo", de Ferenc Molnár, é uma novela interessante de ler por mostrar o poder de mobilização de simples garotos. Por fim, cito "O caçador de pipas" e "A cidade do sol", ambos de Khaled Hosseini, e "Existem crocodilos no mar", de Fábio Geda. São dramas de superação e lealdade lindas de conhecer. As duas primeiras são bem doloridas, é verdade. Mas edificadoras.

Blog - O que o jornal O Estado representa para você? Foi sua primeira experiência no jornalismo cearense?

Bruno de Castro - O "estadinho", como carinhosamente quem passa por lá chama a empresa, é uma verdadeira escola. Eu já tinha experiência em televisão (TV Universitária e TV Jangadeiro) e assessoria de imprensa (Fórum, Prefeitura de Fortaleza e Assembleia Legislativa) quando comecei no OE, mas foi lá onde solidifiquei a postura de jornalista. Como equipe e estrutura eram reduzidas, a gente tinha que ser de um tudo. Do pauteiro a editor de página. Um ritmo puxado, mas que me deu uma visão macro de logística da redação e condução de pautas. Em alguns momentos, ocupei a editoria-geral do jornal. Isto também foi importante para lidar com demandas "de cima", quando necessário. Foi uma experiência fabulosa, em especial por ter tido como "madrinha" uma jornalista genial como Elizabeth Rebouças. Minha geração do OE não me deixa mentir! O contato com a Beth era uma aula diária de Jornalismo e, muitas vezes, me lembrava lições aprendidas com os meninos da técnica da TV Universitária (onde passei dois anos e três meses e sai com a certeza de que, se não fosse jornalista, seria infeliz). Sem a passagem pel'O Estado, certamente eu não teria boa parte da segurança que tenho hoje para "peitar" determinadas coberturas.

Blog - Sabemos que o nobre colega sempre gostou de atuar na área política. Foi assim no jornal O Estado e é assim na Coordenadoria de Imprensa da Assembleia Legislativa do Ceará. 2012 é ano eleitoral. Como jornalista e como cidadão, qual é a sua opinião sobre a situação atual em que se encontra a cidade de Fortaleza? Qual será o grande desafio para o próximo gestor municipal?

Bruno de Castro - O cenário é delicado. Para todos. E, por enquanto, obscuro. Afora alianças políticas, aponto um maior envolvimento popular no cotidiano da gestão como o grande desafio do próximo prefeito(a) da Capital. Os fortalezenses precisam se apropriar mais da cidade onde moram. Fortaleza é um lugar lindo, mas tratado com desleixo por quem vive nela. É preciso mais consciência individual para não termos tantas perdas coletivas. E isto vale para tudo: pro fulano que joga lixo de dentro do ônibus no meio da rua (mas reclama da coleta da Prefeitura), pro beltrano que fecha cruzamento (mas critica a falta de fiscalização da AMC), pro rapaz que fura fila no banco (mas esbraveja contra desfeitas políticas) etc. O fortalezense precisa olhar mais para o próprio umbigo e ocupar mais a cidade. Ir pra rua e zelar pelo Passeio Público, pela orla do Pirambu, pela Praia de Iracema. A cidade é nossa! 

Blog - Suas considerações finais e agradecimentos.

Bruno de Castro - Voltaire, meu querido, já lhe disse o quanto fiquei lisonjeado com o convite para este "perfil". Espero que as ideias colocadas abram horizontes de alguém. Este é o nosso objetivo no mundo. Quando a gente fala da gente, já abre uma janela pra gente mesmo. E tantas se fecham nessa rotina louca, não é mesmo? Saio mais rico desta experiência. Abraço daqui.

# Foto: Kleber A. Gonçalves